sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Brasil de Lula fica maior na cena mundial


Diplomacia ativa na vizinhança, na África e no Oriente Médio tropeçou nos direitos humanos



Em oito anos de mandato, Luiz Inácio Lula da Silva deixou de ser para o mundo apenas o sindicalista que virou presidente de um país exótico para se tornar, também, um ator importante nas relações internacionais.




Lula evitou golpes e causou polêmicas



Para especialistas ouvidos pelo R7, Lula ajudou a ampliar as fronteiras de influência do Brasil, que agora organiza a Copa do Mundo e a Olimpíada. O presidente também Consolidou a presença brasileira na América do Sul. Mas também deu vários tropeços no campo dos direitos humanos e entrou em temas polêmicos, como o Oriente Médio.



O R7 conversou com três professores de relações internacionais sobre alguns pontos da diplomacia de Lula. São eles Hector Saint Pierre, da UNESP (Universidade Estadual Paulista), Maria Helena de Castro Santos, da UNB (Universidade de Brasília) e Paulo Edgard Resende da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica).



Todos concordam que o Brasil ganhou mais relevância no mundo, mas não dão crédito exclusivo ao presidente.



Segundo os três, o crescimento econômico favoreceu o Brasil, que passou de apenas global trader (comerciante mundial) para também global player (ator mundial). Lula, dizem, não foi tão inventivo. Continuou, de algum modo, a política externa do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2003).



A diferença é que apimentou a diplomacia com seu carisma, apertou a mão do presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad (que defende o apedrejamento de Sakineh e teima em desenvolver um polêmico programa nuclear). Também abraçou o quase folclórico Hugo Chávez, que limita rádios e televisões da oposição e quer ficar eternamente no poder na Venezuela.
Lula conta a mesma história de maneira diferente: diz que apertou a mão do “amigo Ahmadinejad” porque alguém teria de falar com ele, pontua Maria Helena. Recebeu, inclusive, uma carta de Barack Obama, presidente dos EUA, incentivando um acordo nuclear com o Irã, algo que as potências mundiais tentavam há tempos e não conseguiam.



O presidente conseguiu, junto com a Turquia, um “acordo histórico”, em maio de 2010 - na prática ignorado pelos EUA, que no outro dia reuniu o Conselho de Segurança da ONU para impor sanções ao Irã.



Sobre Hugo Chávez, o site WikiLeaks recentemente mostrou que o governo do Brasil acha que o presidente da Venezuela ladra, mas não morde. Lula contrabalanceou a América do Sul, ressalta Saint Pierre, muito amparado no seu próprio carisma (resta saber se Dilma Rousseff terá o mesmo traquejo).



Relações com os EUA não foram ruins



Lula falou com Chávez e tomou uma “aguardente” com o arquirrival do venezuelano, o ex-presidente Álvaro Uribe da Colômbia. Abraçou todos os líderes latino-americanos.



Ele nunca deixou de falar com os EUA, seja com o republicano George W. Bush - ex-presidente dos EUA que liderou a invasão ao Iraque em 2003 -, seja com o atual Barack Obama, ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 2009. Obama chegou a dizer, inclusive, que Lula era “o cara”. As relações com o EUA nunca estiveram de fato ruins, diz Resende.



A conclusão é que Lula falou com todo mundo: com o Ahmadinejad do Irã, com Shimon Perez de Israel, com o amigo Nicolas Sarkozy da França (este de olho na venda bilionária de caças Rafale para a FAB), com Hu Jintao da China e com vários ditadores africanos.



Lula também defendeu a ditadura os irmãos Fidel e Raúl Castro em Cuba e foi criticado por não apoiar os presos políticos do regime comunista. Ainda assim, foi tratado como celebridade por jornais estrangeiros, como o espanhol El País e o francês Le Monde.



Lula só não falou com Honduras



Em setembro de 2009, Manuel Zelaya, presidente de Honduras foi deposto num golpe meio fora de moda (ao estilo das ditaduras latino-americanas dos anos 1960 e 1970), buscou refúgio na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa. Lula foi jogado no centro da crise hondurenha.



O Brasil e a maior parte da América Latina não reconheceram as eleições realizadas pelo governo golpista que derrubou Zelaya - a votação teve apoio dos EUA. Acabou prevalecendo a posição americana. Para Saint Pierre e Resende, o Brasil tomou a posição correta. Maria Helena diz que a atuação brasileira foi “um desastre”.



Em oito anos, Lula fez 262 viagens ao exterior, visitou 81 países e três territórios e abriu 44 embaixadas e 21 consulados. Sempre andou acompanhado de Celso Amorim, o ministro das Relações Exteriores que mais tempo esteve à frente do Itamaraty (superando o Barão do Rio Branco, o pai da diplomacia brasileira). Também esteve ao lado de seu polêmico assessor especial, Marco Aurélio Garcia.



No dia 1º de janeiro de 2011, Lula entrega o governo, mas, ao que tudo indica, sua atuação externa e suas andanças pelo mundo vão continuar. Resta saber o que está guardado para o futuro ex-presidente.

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