Dilma com Ana Maria Braga: a estratégia, a imagem e a notícia
A estratégia política
Quando a presidenta Dilma foi à cerimônia de 90 anos da Folha de São Paulo, na semana passada, causou mal-estar em todos nós que apoiamos o governo Lula e a candidatura dela, contra o jornalão. Mas, como estratégia política, ela estava certa.
Ela colocou no bolso a oposição demo-tucana paulista e o PIG (Partido da Imprensa Golpista). A oposição, que já está na UTI, ficou menor ainda, foi desarmada, com ela sendo o centro da festa em pleno reduto oposicionista. De quebra, Dilma tomou a bandeira da liberdade de imprensa, daqueles que a criticavam justamente por isso.
Se nós sentimos mal-estar, pior foi para os reacionários demo-tucanos verem FHC, Alckmin, José Serra fazerem fila para beijar a mão da presidenta. Pior para eles foi ver FHC pedir audiência àquela que ele chamava de "poste". A oposição sentiu o golpe, tanto que enquanto nós aqui discutimos abertamente, eles simplesmente abafaram o caso, tratando com descrição para reduzir danos.
O que dá prestígio a um jornal não é cerimônias como estas, por mais gente importante que compareça. O que dá prestígio a um jornal são notícias exclusivas. É preciso notar que Dilma não concedeu ao jornalão nenhuma entrevista exclusiva, nem antecipou nenhuma notícia do governo que pudesse ser manchete.
Dilma também será vista na Rede TV, onde gravou entrevista para a estréia do Programa da Hebe Camargo; e na TV Globo, no programa de Ana Maria Braga, gravado hoje, e que deve ir ao ar amanhã, em comemoração pelo Dia Internacional da Mulher.
Desta vez a Presidenta gravou entrevista (diferente do que fez na Folha), mas de novo, dosou a "ração" que oferece ao PIG. Pelo que antecipa o G1 (das organizações Globo), também não haverá "furos", sendo uma conversa sobre amenidades, inclusive culinárias.
Obviamente que a Globo gostaria de uma entrevista da Presidenta no horário nobre, em um programa como o Fantástico, mas Dilma concedeu para um programa de nicho e para uma apresentadora que manteve-se isenta durante a campanha eleitoral (mesmo que tenha servido à oposição no passado como militante do fracassado movimento Cansei).
A imagem
Os telespectadores (na maioria telespectadoras) terão a oportunidade de prestar atenção no que ela diz, em vez do que dizem dela. Para o perfil da audiência desses programas, não é uma má decisão a Presidente aparecer como ela é.
É bastante provável que uma boa parte das telespectadoras destes programas tenham formado uma imagem deturpada da Presidenta pelo que ouviram dizer de homens que acompanham a política, e passem a ficar com uma boa imagem dela.
O problema é conseguir ganhos de imagem pelo lado do PIG, e perda da imagem junto à militância aguerrida do outro lado do PIG, que tem se sentido preterida, conforme inúmeros comentários sinceros na última semana, aqui e em diversos outros blogs.
O governo que Dilma está fazendo é, em essência, o que Lula faria se tivesse um terceiro mandato. As decisões que Dilma está tomando, tirando uma escolha ou outra, são as mesmas que Lula tomaria. Então, por que essa percepção não está chegando à militância?
Alguma coisa precisa ser feita para não baixar o moral da militância e não desestimular a mobilização conquistada, sem querer.
A notícia
A democratização dos meios de comunicação passa pela democratização da interlocução, e isso independe de novos marcos regulatórios. Depende da comunicação governamental diversificar os interlocutores com a sociedade.
Quantas vezes vimos no governo Lula, o presidente e a própria Dilma quando ministra, concederem entrevistas coletivas, e todo o PIG pinçarem trechos fora do contexto para usarem contra eles?
Era a blogosfera quem tinha que procurar a entrevista inteira e desmentir as artimanhas do PIG, travando uma verdadeira guerra pelo livre fluxo das notícias, sem a censura e manipulação do PIG.
O PIG teve sua lua-de-mel até com Lula no início do mandato, em 2003, quando as empresas de mídia estavam falidas e tentavam socorro no BNDES. Depois detonou-o, quando não conseguiram socorro, e conspiraram abertamente com um noticiário seletivo no "mensalão".
É natural que o PIG tenha sua lua-de-mel com Dilma, agora no início do mandato, e que Dilma explore bem essa boa relação neste período, até como estratégia de fortalecer-se para batalhas futuras.
Mas é importante nunca perder o foco de fortalecer as outras mídias que fazem contraponto ao PIG, nem desmobilizar a militância, porque elas serão necessárias na hora em que a oposição sair da UTI, já nas eleições de 2012, e mais ainda quando despontar um candidato das elites realmente viável para 2014 (até mesmo dissidente da base governista), certamente apoiado pelo PIG.
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