Nesta quinta-feira, o TRF da 1ª Região analisa se abre ação penal contra o ex-chefe do MP local por suposta conduta ilegal para favorecer, em 2009, Antônio Cerqueira, ex-comandante da Polícia Militar do Distrito Federal
Lilian Tahan
Publicação: 02/05/2011 06:00 Atualização: 02/05/2011 06:15
Passada a primeira fase do julgamento no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o ex-procurador-geral de Justiça do Distrito Federal Leonardo Bandarra enfrentará esta semana mais uma importante etapa no universo das denúncias que o acusam de ter se afastado da conduta esperada por um representante do MP. Na próxima quinta-feira, a Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF) decidirá se abre ou não ação penal contra Bandarra em um processo no qual é denunciado por ter agido, supostamente, em favor do ex-governador José Roberto Arruda para preservar o ex-comandante da Polícia Militar coronel Antônio Cerqueira e contra o interesse público.
Na sessão do dia 5, os 17 desembargadores que compõem a Corte Especial do TRF da 1ª Região vão dar encaminhamento que pode ser decisivo a respeito de uma das denúncias que comprometem Bandarra. Isso porque a pena para o crime atribuído ao ex-chefe do MP prescreve na próxima semana, ou seja, se a Justiça não acatar a denúncia ajuizada pela Procuradoria Regional da República até quinta-feira, a ação perderá o objeto e o assunto estará praticamente encerrado(leia mais em Entenda o caso).Uma das hipóteses consideradas é o não comparecimento dos advogados de defesa, o que poderia resultar em vitória forçada para os acusados, já que o tema não seria julgado em função das garantias constitucionais de ampla defesa, uma vez que a próxima sessão só ocorreria após a prescrição do caso.
Constrangimento
A denúncia que entrará na pauta da Corte Especial do TRF esta semana também aponta como réu o promotor Nísio Tostes, da Promotoria de Justiça Militar do Ministério Público. Bandarra e Nísio são acusados de pressionar o colega Mauro Faria de Lima para evitar que, em maio de 2009, ele denunciasse o então comandante da PM, coronel Cerqueira, por crime de peculato — quando um agente público se beneficia do cargo para desviar dinheiro ou obter vantagens. À época, Bandarra e Nísio participaram de reuniões com Mauro para tratar do assunto. O ex-procurador-geral de Justiça do DF teria agido, segundo sustenta o Ministério Público, como um emissário de Arruda em favor de Cerqueira. Nísio teria ajudado na investida para evitar a oferta da ação penal.
O próprio Mauro chegou a reclamar publicamente do constrangimento a que estaria sendo submetido em função da denúncia contra o comandante da PM. Em 14 de maio de 2009, Mauro Faria disse em entrevista que nunca havia sido submetido a tanta pressão em 18 anos de carreira. “Recebi pedidos em nome de tudo. Só em nome da moralidade pública e da honestidade não ouvi nenhum pedido”, afirmou, alegando que Bandarra havia assumido posição em nome da boa convivência do MP com o governo e Nísio, por sua vez, da boa relação com a PM.
Para o Ministério Público, a ingerência foi criminosa e, por conta dela, os procuradores regionais da República Ronaldo Albo e Alexandre Espinosa ajuizaram ação penal contra Bandarra e Nísio Tostes. No conselho, que julga os processos administrativos contra integrantes do MP, esse caso também foi objeto de investigação. Na defesa apresentada por Bandarra, a comissão processante teria desconsiderado depoimentos dos promotores Nísio Tostes e Paulo Gomes — que também atua em processos militares — nos quais disseram não ter havido interferência a pedido de Arruda, mas apenas uma solicitação para que Mauro aguardasse alguns dias antes de ajuizar a ação, enquanto se discutia a sucessão no comando da PM. Havia a intenção de que a denúncia não coincidisse com as comemorações dos 200 anos da corporação e a oficialização de um pedido de aposentadoria de Cerqueira.
Mas o relator da ação no CNMP, Luiz Moreira, considerou que a conduta de Leonardo Bandarra foi “desconforme ao princípio da independência funcional’ e pediu suspensão por 90 dias do ex-procurador-geral do DF em virtude dessa acusação. Na Justiça, os advogados do ex-chefe do MP confiam que o caso será encerrado sem que o TRF aceite abrir a ação penal, o que, se ocorrer, significará uma vitória para Bandarra em meio às denúncias que responde por corrupção, extorsão e formação de quadrilha.
“São fatos atípicos e não constituem crime nem infração administrativa. O que ocorreu foram fatos corriqueiros, próprios do dia a dia do Ministério Público”, sustenta Cezar Bitencourt, que atua em defesa de Bandarra. Sobre a possibilidade de faltar à sessão do próximo dia 5, Bitencourt descarta a hipótese: “Não há a menor chance. Estaremos lá para vencer no mérito”. Ele atua em parceria com o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça Nilson Naves. À frente da defesa de Nísio Tostes está o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sepúlveda Pertence. A expectativa é de que ele também esteja presente na sessão da Corte Especial desta quinta-feira.
Sessão interrompida
O Conselho começou a julgar as denúncias contra Leonardo Bandarra e a promotora de Justiça Deborah Guerner em 6 de abril. Na ocasião, o relator do caso, conselheiro Luiz Moreira, leu o seu voto e pediu a demissão dos dois promotores. A sessão, no entanto, foi interrompida por pedido de vista. A segunda etapa do julgamento administrativo de Bandarra e Deborah está marcada para 17 de maio.
São fatos atípicos e não constituem crime nem infração administrativa. O que ocorreu foram fatos corriqueiros, próprios do dia a dia do Ministério Público”
Cezar Bitencourt, advogado de Leonardo Bandarra
Crimes considerados de baixo potencial ofensivo têm punições menos severas, que podem variar de dois meses a um ano de prisão, tendo a possibilidade, inclusive, da substituição por penas alternativas. É o caso da denúncia envolvendo o ex-procurador-geral de Justiça do DF Leonardo Bandarra e seu colega de Ministério Público Nísio Tostes. Ambos são acusados de tentar agir para evitar oferecimento de ação penal contra o ex-comandante da PM coronel Antônio Cerqueira.
Para os crimes em que a pena máxima é de um ano, a prescrição se dá em três anos — contados a partir da data em que ocorreu o evento criminoso. Em 2009, no entanto, época em que Bandarra e Nísio foram acusados de ingerência para atender a um pedido do ex-governador José Roberto Arruda, a lei estabelecia dois anos como prazo para a prescrição dos crimes de baixo potencial ofensivo. Como há um princípio constitucional de que a legislação não pode retroagir para prejudicar ninguém, o suposto crime cometido por eles no episódio prescreve na primeira quinzena de maio, exatamente dois anos depois da suposta irregularidade. (LT)
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