terça-feira, 26 de abril de 2011

Cristovam vê Agnelo preso ao tradicional


Da redação em 25/04/2011 16:32:43



Francisco Dutra, Jornal de Brasília



“Deixado de lado” no governo de Agnelo Queiroz, o senador Cristovam Buarque (PDT) não economiza nas críticas à gestão petista. Nesta entrevista ao Jornal de Brasília, ele aponta falhas na gestão e afirma que o petista muito se assemelha a ex-governadores do DF. “Agnelo está muito preso à política tradicional. Do ponto de vista de obras, o governo está muito verde, lembrando Arruda, e muito azul, lembrando Roriz”. Cristovam também critica o fato de o vice-governador Tadeu Filippelli ter papel de destaque no governo. “Tinha que ser muito mais discreto, sem nenhuma função”. Sobre a possibilidade de se candidatar ao GDF em 2014, ele diz que tem sido pressionado por populares, partidários e petistas para concorrer, caso Agnelo não tenha sucesso. “Como a minha preferência é não voltar, quero que o governo dê certo. Não está na minha estratégia ser candidato a governador, só se eu sentir que é uma obrigação com a cidade”.



Qual é a sua agenda política para este ano?



A agenda de sempre. Lutar para que o Brasil seja mais eficiente, mais justo e democrático. Mas como fazer isso? Continuando a ser o senador de Brasília e o senador da Educação. Na campanha, eu disse que ia acrescentar o tema da Saúde.Porque são os pontos que têm a ver com a moral, mais do que com a política. Porque não é imoral haver desigualdade no transporte. Mas é imoral uma pessoa morrer por falta de dinheiro, é imoral uma criança não ter acesso a uma boa escola por falta de dinheiro. E, claro, nesse momento, circunstancialmente, eu estou muito preocupado com a inflação.



De onde vem a preocupação com a inflação?



Porque se a inflação voltar em níveis altos, ninguém mais vai falar de Educação e Saúde. Só vai falar de preço, salário e aquelas coisas do passado. Eu tenho falado no Senado sobre a defesa de um pacto de patrões, trabalhadores, governo, oposição para que a gente não deixe voltar a tragédia da inflação. Ele deve ser para se usar as ferramentas monetárias, como a taxa de juros. Usar, sobretudo, a política gastos públicos. É aí que está a grande causa do risco da inflação. É o aumento dos gastos públicos. A outra causa é a importação, mas a maneira como a política cambial está sendo feita, mantendo o real supervalorizado, reduz o risco da inflação importada. Claro que a um custo muito alto, porque reduz as exportações.



E quanto aos gastos públicos?



O gasto público crescendo não apenas pressiona os preços, porque aumenta a demanda, mas gera a expectativa de que a inflação venha. E essa expectativa é a maior causa das inflações, muitas vezes. Quando a presidente falou que ia reduzir os gastos em R$ 50 bilhões, deu uma certa expectativa de freio na inflação. Mas, por um lado, se fala em redução de gastos, por outro lado fala-se em Copa do Mundo, Olimpíadas, trem-bala e tudo isso cria um pacote de gastos que termina ampliando a demanda. E a capacidade produtiva do Brasil está perto do seu limite. E, se você aumenta a demanda e não tem como ampliar a produção, os preços sobem. Acho que o governo tem que fazer corte seletivo. Vamos procurar a gordura, inclusive no Congresso e no Judiciário.



E por que incluir, entre suas prioridades, a Saúde?



Como governador, eu provei que era possível cuidar bem da saúde. Esse noticiário que a gente tem hoje de saúde não acontecia no meu tempo. O Saúde em Casa, um programa que atendia o doente perto da casa dele, dá um retorno altíssimo e reduz a pressão sobre os hospitais. Eu não estou vendo o governo Agnelo trazer de volta o Saúde em Casa. Eu vejo o governo Agnelo falando de hospitais e de UPAs (Unidades de pronto atendimento). UPA não é um mini-hospital, custa caro e fica longe da casa do cidadão. O Saúde em Casa é uma casinha com três profissionais. Nós temos três níveis na Saúde: a preventiva, a familiar e a hospitalar. Eu estou vendo o Agnelo se preocupando muito com a área hospitalar. Por quê? Porque hospital a gente inaugura. O Saúde em Casa não se inaugura. Agnelo está muito preso à política tradicional.



Tradicional, em quê sentido?



Ele ainda não demonstrou que é uma pessoa que ganhou para romper. Não demonstrou que foi eleito por um pacto muito amplo, mas conduzido por partidos de esquerda. Quem estava na frente da campanha eram PT, PDT, PSB e PCdoB. Esse pessoal é vermelho. Nós somos vermelhos. E o governo está muito verde, lembrando (o ex-governador José Roberto) Arruda. E muito azul, lembrando (o ex-governador Joaquim) Roriz. Isso do ponto de vista de obras. A sensação que eu tenho é que o doutor Agnelo está querendo deixar a marca do engenheiro Agnelo.



O senhor pensa em se candidatar para o Buriti em 2014?



Eu não estou pensando nisso. Estou com a cabeça no meu mandato. Agora tem muita gente falando nisso. Muita gente na rua. Muita gente me responsabilizando pelo meu papel na eleição do Agnelo. E (dizendo) que se o governo dele não der certo, eu teria que ser candidato. Sobretudo, dentro do meu partido, de outros e até dentro do PT. Como a minha preferência é não voltar, eu quero que o governo Agnelo dê certo. Não está na minha estratégia ser candidato a governador, só se eu sentir que é uma obrigação para com a cidade.



Existem nomes melhores do que o de Agnelo para o governo?



Dentro do próprio PT, há vezes eu tenho dúvidas, se o próprio (Geraldo) Magela não seria melhor candidato do que Agnelo. A disputa entre eles foi muito grande. Tenho minhas dúvidas. Hoje, talvez uma chapa com Magela tivesse sido melhor do ponto de vista do governo. Magela tem mais diálogo. Desde dezembro, a única conversa que tive com Agnelo foi no almoço do (presidente dos Estados Unidos, Barack) Obama.



O que falta no governo Agnelo?



Não está havendo direção. E o que percebe-se – ainda não está muito claro – é que é um governo muito tradicional. Não se vê a cara de um governo de esquerda, progressista. Aí não quero estar dentro. Quando eu queria estar dentro, era no sentido de dar uma cara vermelha. Ninguém está vendo cara vermelha na Educação, por exemplo.



Quais erros o senhor vê na Educação?



Na Educação, ele assumiu o compromisso na campanha de erradicar o analfabetismo, que não é tão difícil, e implantar a educação integral para valer, em algumas cidades. Eu não vi isso ainda em andamento. Acho que é um erro não só na Secretaria de Educação, mas em todas as secretarias. Eu acho que o governo está confundindo progressista com estatizante.Eu acho que a gente tem que publicizar as coisas, torná-las públicas, não estatizá-las. Tem coisas estatais que não servem ao público, servem aos funcionários da instituição. E não foi para isso que a gente ganhou.



Como o senhor avalia o início do governo Agnelo?



Você não pode julgar um governo em 120 dias. Mas pode julgar suas ideias em 120 horas. O governo Agnelo tem as mesmas ideias de antes. Construção, por exemplo, o Roriz fez para caramba. O Arruda também fez. Eu estou achando que a marca que o governo Agnelo quer deixar é o estádio novo, o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) e o túnel de Taguatinga. Isso outros governos também fazem (SIC). Mas aí você me diz: ele vai fazer com ética. Ética é obrigação. Eu não meço ética. O que nos diferencia são as ideias.



Comenta-se que o senhor teria recebido um convite de um órgão internacional e que deixaria o Senado.



Isso é uma maluquice completa. Não recebi nenhum convite. Eu era membro do Conselho do Instituto de Educação da Unesco. Era. Porque terminou meu mandato agora. E sou membro do Conselho da Universidade das Nações Unidas. Órgão nenhum me chamou. Não há nada. No caso (de me candidatar ao) governo, eu disse que não estava nos meus planos. Ir para um órgão internacional, estou dizendo que não existe.



O governo Agnelo não anda tendo problemas com oposição. Isso é ruim?



Estou preocupado. Porque governo sem oposição fica fácil de administrar, mas fica difícil de governar.

Quando você tem uma oposição é porque você está sendo contestado. Quando você não tem,é porque você está fazendo o mesmo que vinha sendo feito. Eu sofri muita oposição e foi virulenta. Mas isso tinha um papel. Nós cobrávamos muito cuidado. Porques sabíamos que qualquer errinho viraria um imenso escândalo.Hoje, se o governo Agnelo errar quem vai fazer o escândalo na Câmara Legislativa? Isto demonstra monstra que ele cedeu a oposição, porque se identificou, porque não mudou. Quem está contra hoje o governo Agnelo?



É possivel dizer que as frentes políticas ligadas a Roriz e a Arruda estão mortas?



Eu acho que estão muito vivos. Não esqueça de que quem tirou o Roriz do páreo foi a Justiça. Não foi o eleitor não. Não pode esquecer isso.Roriz não pode disputar a eleição, não foi o rorizismo que morreu. Enquanto ao Arruda, ele não foi condenado em nada. O Arruda, se tivesse um partido, poderia ser candidato hoje. Acho um erro achar que eles morreram. E tem mais: cada gesto errado do governo Agnelo é mais água para Roriz e Arruda. O povo está de olho. O PSOL deu início a uma oposição de esquerda.



O senhor acha que isso pode avançar?



É perfeitamente possível, daqui a um ano, que outros partidos de esquerda venham se juntar ao PSOL. Não vejo por que não, se o PSOL quiser. Porque, por enquanto, o PSOL quer continuar PSOL. Mas, se mudar de ideia, acho perfeitamente possível que o meu partido possa participar. Tem gente dentro do partido que fala por uma razão muito simples, Agnelo fez opção por uma pessoa do PDT, o deputado Israel e abandonou o partido inteiro. Ele escolheu um parlamentar que acho que teve 10 mil votos e deixou de lado um milhão e cem mil, que fui eu e o

(deputado federal) Reguffe, juntos. Tem lógica no curto prazo, para as votações na Câmara. Mas, no médio e longo prazos, não é uma boa decisão. Até por que o deputado (Israel) fez todas as negociações por fora do PDT e eu diria até contra o partido, em alguns momentos.



Como o senhor avalia a aliança do PT com o PMDB?



Eu fui daqueles que defendeu que o PMDB devia estar junto conosco. Eu acho que o (vice-governador Tadeu) Filippelli tem um papel muito importante. Eu disse ao Filippelli, logo depois da eleição, que achava que ele é um político que soube e teve coragem de mudar de lado. E que estava convencido de que ele tinha mudado, pelo sentimento político dele que nós estávamos vivendo novos tempos, que não se justificava mais aquela política do Roriz. Mas fiz uma recomendação, que ele fosse só, única e exclusivamente, vice-governador. Fosse discreto. Para poder ganhar força nesse outro lado para o qual ele veio. Eu me assusto quando vejo ele com um papel muito importante no governo. Quando vejo ele na responsabilidade de administrar ele e todo o seu bloco, das obras por exemplo, como faziam antes. Não por desconfiança, pelo que eles venham a fazer ou não. Mas pela

percepção de que a população olha com desconfiança. Outra coisa: certas pessoas se cometem um erro, do ponto de vista de uma construção, são julgadas apenas por aquele erro. Mas aqueles que vinham de antes, se cometerem erros agora, ninguém vai avaliar como um erro, vão achar que é uma repetição voluntária de fazer de novo daquele jeito errado. Foi certa a vinda dele para o governo. Mas está sendo errado o papel dele hoje. Tinha que ser muito mais discreto, sem nenhuma função.



Muito se comenta sobre disputas internas entre PT e PMDB.



Estou muito preocupado. Porque estão disputando duas coisas. Não estão disputando o rumo do governo. Se fosse isso, era bom. Estão discutindo cargos. Isso é muito ruim. E estão discutindo já pensando na próxima eleição. Um dos problemas do governo Agnelo é que ele não tem secretários, tem candidatos. A maior parte dos

secretários importantes já estão em campanha. São as pessoas pensando em suas eleições, não na reeleição do Agnelo. Isso acaba com o espírito de corpo e começa uma briga interna. Então, a disputa é por cargos e votos. E aí as nomeações são feitas para conseguir cabos eleitorais e não bons trabalhadores no governo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário