Ana Maria Campos
Os defensores da promotora deixaram o caso após garantirem a soltura dela e do marido do Complexo da PF
A promotora de Justiça Deborah Guerner chega numa semana crucial de seu julgamento como suposta integrante de um esquema de corrupção desbaratado na Operação Caixa de Pandora sem defesa constituída. A integrante do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) foi notificada pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região para esclarecer quem vai defendê-la no plenário do Conselho Especial na próxima quinta-feira, quando os desembargadores federais vão apreciar o recebimento de duas denúncias que tramitam contra ela e o ex-procurador-geral de Justiça do DF Leonardo Bandarra. O TRF vai decidir se abrirá processo criminal contra eles por concussão, vazamento de informações, formação de quadrilha e extorsão.
Deborah também está sem representante no processo administrativo disciplinar que responde no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), cujo julgamento será retomado na próxima terça-feira. A sessão foi suspensa em 6 de abril por um pedido de vista do conselheiro Achiles Siquara depois que o relator do caso, Luiz Moreira, pediu a pena máxima para Deborah e Bandarra, ou seja, a demissão. Outros dois conselheiros, Bruno Dantas e Almino Afonso, acompanharam o relator.
Os advogados que representavam a promotora e o marido dela, Jorge Guerner, Pedro Paulo Guerra de Medeiros e Paulo Sérgio Leite Fernandes, abandonaram o caso na semana passada, depois que conseguiram livrar o casal da prisão no Complexo da Polícia Federal (PF) com uma liminar concedida pelo ministro Napoleão Nunes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Eles alegaram “descumprimentos contratuais” para renunciar à causa. A última medida adotada pelos advogados foi a elaboração da defesa prévia incluída na denúncia que provocou a prisão preventiva de Deborah e do marido. Ela é acusada de tentar enganar a Justiça com a simulação de insanidade mental.
A notificação do TRF tem uma preocupação. Todo cidadão tem direito de defesa. Dessa forma, se a promotora e seu marido não apresentarem um novo representante para atuar na sessão do próximo dia 19, o Tribunal deverá designar um defensor público da União ou um advogado a ser designado pela relatora das duas ações penais, a desembargadora federal Mônica Sifuentes. A falta de assistência jurídica pode provocar um pedido de adiamento da sessão marcada para receber a denúncia.
Neste caso, caberá à relatora deferir ou não o pedido. O Ministério Público Federal considera que não há motivos para adiamentos, já que durante toda a fase de investigação e instrução da ação, até agora, o casal Guerner teve direito a defesa e, na ausência de um advogado próprio, um novo defensor será nomeado para fazer a sustentação oral na sessão.
Nos dois processos que serão examinados na próxima semana, Leonardo Bandarra é representado pelo criminalista Cezar Bitencourt. Na semana passada, o ex-chefe do Ministério Público local sofreu uma derrota no TRF. Por maioria, os desembargadores decidiram receber a denúncia por advocacia administrativa, proposta pelo procurador regional da República Ronaldo Albo contra Bandarra e o promotor Nisio Tostes, da Auditoria Militar do MPDFT.
Eles são acusados de interferir na atuação do promotor Mauro Faria de Lima em 2009, na fase em que ele decidiu ajuizar uma ação penal por peculato contra o então comandante-geral da Polícia Militar do DF, Antônio Cerqueira. Bandarra e Nisio negam a acusação e dizem que a denúncia se baseia apenas no depoimento de Mauro Faria. Nas outras acusações, Bandarra afirma ser vítima de uma campanha promovida por Durval Barbosa, o delator da Operação Caixa de Pandora, e sustenta não haver provas diretas que o incriminem.
Início
A ação penal por fraude processual, falsidade ideológica e formação de quadrilha ainda está no início da tramitação na Justiça. O psiquiatra Luis Altenfelder, denunciado como o orientador do teatro da loucura protagonizado por Deborah Guerner com a ajuda do marido, Jorge Guerner, sequer havia sido notificado até ontem à tarde em São Paulo, onde mora, para apresentar defesa.
Bandarra diz ser vítima de uma campanha articulada por Durval Barbosa
As acusações
O Ministério Público Federal sustenta que os promotores Leonardo Bandarra e Deborah Guerner exigiram, em 2008, dinheiro para repassar informações privilegiadas a Durval Barbosa sobre investigações do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT). Durval teria entregue R$ 1 milhão a Deborah para saber antecipadamente que sua casa seria alvo de uma ação de busca e apreensão durante a Operação Megabyte, coordenada pelo promotor Eduardo Gazzinelli. Ele apurava esquema de lavagem de dinheiro desviado de contratos de informática com o GDF, liderado por Durval.
Segundo a denúncia, Deborah Guerner, mesmo sem poder de influência nas investigações do MPDFT, teve acesso a uma minuta relacionada a pedido de busca e apreensão. Elaborado por Gazzinelli num notebook em caráter restrito, o documento teria sido mostrado por Deborah a Durval. Nas investigações, Gazzinelli é apontado como paranoico com vazamentos de informações. Por isso, evitava mostrar petições a colegas. Apenas um círculo pequeno de promotores, entre os quais Bandarra, teve acesso às informações. De acordo com o MPF, o ex-procurador-geral de Justiça do DF passou o documento a Deborah, que por sua vez exibiu para Durval. Em troca, os dois promotores teriam exigido R$ 1 milhão e ainda pedido uma mesada de R$ 300 mil para blindar ex-secretário de Relações Institucionais no Ministério Público do DF.
Caso sejam condenados na Justiça, Bandarra e Deborah podem cumprir pena de dois a oito anos de reclusão pela concussão. Pelo crime de violação de sigilo funcional, a pena prevista é de seis meses a dois anos de detenção. No caso da formação de quadrilha, a punição é de um a três anos de reclusão. A denúncia inclui Bandarra, Deborah Guerner, o marido dela, Jorge Guerner, e Cláudia Marques, ex-servidora do GDF e amiga da promotora, que teria intermediado os encontros. No Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), discute-se a demissão dos dois promotores pelo envolvimento nos crimes.
Extorsão
Na denúncia, o Ministério Público Federal afirma que Leonardo Bandarra e Deborah Guerner uniram-se com o apoio de Durval Barbosa e do executivo Marcelo Carvalho, ex-presidente das Organizações Paulo Octávio, para extorquir o então governador José Roberto Arruda, em meados de 2009. De acordo com a ação penal, Deborah Guerner marcou uma reunião com o ex-governador na residência oficial de Águas Claras, onde chegou acompanhada de Marcelo Carvalho.
No encontro, Deborah teria exigido R$ 2 milhões em troca de manter o sigilo sobre a existência do vídeo em que Arruda aparece recebendo dinheiro do ex-secretário de Relações Institucionais na campanha de 2006. Arruda confirmou ter sofrido o achaque, mas disse que não pagou. Vídeos apreendidos na casa da promotora sugerem conversas em que ela discute com Bandarra, em linguagem cifrada, uma forma de abordar Arruda para exigir o pagamento.
Deborah teria recebido a gravação feita por Durval de Cláudia Marques e usou as imagens para conseguir dinheiro. O ex-governador nega participação de Bandarra no episódio, mas afirma que, na ocasião, relatou a ele a extorsão sofrida. Se forem condenados, os acusados podem pegar pena de quatro a 10 anos de reclusão. No CNMP, também neste caso, a punição prevista é de demissão dos dois promotores.
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